quinta-feira, 12 de julho de 2012

Nascer ou não com o cu virado para a lua

Eu adorava ser uma pessoa cheia de sorte. Daquelas pessoas que nasceram com o rabinho virado para a lua e pouco ou nada têm de fazer para terem o que desejam. Não estou a dizer que sou uma infeliz, que não sou, aliás, não podia ter melhores pais, irmão, família e condições que na altura de crise em que vivemos, ainda nos são permitidos pequeninos luxos e hoje em dia, para isso, é preciso ter muita sorte. Estou a referir-me à minha vida académica que acredito ser uma das centenas de pessoas nesta posição.  Sempre fui boa aluna, desde a primária, e estudar nunca me causou embaraço. Apesar de ser muito melhor a letras e línguas que a números e ciências, sabia à partida para que disciplinas deveria insistir e empenhar-me mais e nunca desisti de tentar fazer sempre melhor. Os primeiros quatro anos foram concluídos com sucesso, acabando por ter "Excelente" a tudo menos a Matemática que tive "Satisfaz Bastante". No entanto posso gabar-me de que fui das alunas com melhores bases para os anos seguintes e no 6º ano, na minha escola básica, foi criado o Quadro de Mérito que distinguia os alunos com média mínima de 4.5 e que me orgulho de dizer que fiz, até ao 9º ano, parte desse grupo distinto. Os professores sempre me descreveram como responsável e muito empenhada e desde que me lembro estou habituada a dar o litro na época de testes/exames. Desde muito nova que me sinto frustrada com notas abaixo de Satisfaz Bastante (na primária), 70% (no básico) e 14 (no secundário) principalmente a disciplinas que eu sei que consigo muito melhor. Oh! quantos fins de semana ficaram por gozar, quantas festas ficaram por celebrar, quantos cafés com amigos ficaram por tomar porque tinha mesmo de me esforçar ao máximo sempre com os olhos postos na média final. Houve alturas que estive sem comer nada até ás 5.30h da tarde por estar sempre em aulas, a finalizar trabalhos, começar outros, e só quando estava prestes a cair para o lado de exaustão e fome é que me vi obrigada a parar para comer qualquer coisa e voltar ao serviço. Durante o período de aulas eu não sabia o que era chegar a casa e ver televisão. Eu chegava a casa e estudava, preparava tudo para o dia seguinte, adiantava o inadiável, terminava o que estava pendente, e pelo meio jantava. Ia para a cama cedo porque no outro dia o despertador tocava às 7 da manhã.
Durante a primeira época de testes e entrega de trabalhos (uma ou duas semanas) no meu 10º ano, emagreci 4 quilos por não ter tempo de comer nem dormir. Abdiquei de tudo pelos estudos e nem me importava porque sempre fiz o que adoro.
Claro que no final do meu 12º ano este esforço árduo deu resultados e terminei com média de 17. Mas agora é que entra o lobo mau da história - os exames nacionais que literalmente me foderam a vida, as férias, os sonhos, as ambições e 12 anos de trabalho árduo, assim como um ano da minha vida.
Sou rapariga de ideias fixas e no 10º já sabia o que queria (já lá vão 4 anos e a decisão mantém-se) mas também sou muito ligada aos meus pais, aos meus amigos e ao meu namorado, à minha cidade, à minha Princesa e ao meu lugar e a hipótese de ir para uma universidade longe de casa nem se punha em questão. Resumindo e concluindo, maus resultados nos exames aliado a uma falta de informação indecente que os alunos que se querem candidatar ao ensino superior têm deu em muito mau fim. Decidi parar este ano. Só de pensar que podia ir para longe dava-me vómitos e ataques de choro sem fim e os meus pais, a custo, aceitaram a minha decisão.
Este ano parei. Se mudei de ideias em relação ao meu futuro? Admito que vacilei entre design de moda e design de interiores, mas no fim, moda ganha sempre e penso que se não seguir isso serei uma frustrada para o resto da vida (ou não, quem sabe?). Meti recursos atrás de recursos para subir a nota, fiz as 2 fases dos 2 exames e candidatei-me às 3 fases para acesso ao ensino superior. Coloquei-me num curso qualquer na universidade que queria apenas com o objectivo de pedir uma transferência interna mas foi-me logo dito que não era fácil, teria de pagar as propinas e não garantiam nada. Decidi sair. Passei o ano a estudar para os exames nacionais. Eles chegaram. Limpei o meu nome no de Português, mas no Desenho (é preciso ter cu) falta-me um valor (puta de vida) para conseguir a média do meu curso e por isso não descansei. Meti recurso, que nisso eu já sou mestre.
Como tábua de salvação tinha Design de Produto que vai abrir sem média e que não desgosto de todo mas hoje vim a saber que pedem 2 provas de ingresso e por isso, a minha tábua acabou de afundar. Tendo em conta que na 2ª fase dos exames nacionais terei de sacar um 16 a Desenho para puder sonhar entrar no curso, e que é praticamente impossível (pelo simples facto de eu ser uma pessoa sem ter nascido com o cu virado para a lua) terei de ter muita esperança que a alma caridosa que me vai reavaliar o exame tenha filhos na mesma posição que eu, que tenha o coraçãozinho quente e sensível e que por favor me conceda a oportunidade de entrar naquilo com que sonho há 4 anos e pelo qual estou a trabalhar há 13!
Caso entre no meu adorado curso, sei que serei uma pessoa completamente feliz e realizada, sei que aceitarei todos os trabalhos, todos os exames, toda a carga horária, toda a pressão com um sorriso nos lábios e uma lágrima no canto do olho.
O país tem centenas (milhares?) de casos de alunos fantásticos, cheios de capacidades, vontade e entusiasmo e nunca lhes é dado a oportunidade de fazerem o que amam e mostrarem ao país a sua paixão, a vida dessas pessoas nunca é facilitada e há tanta lágrima e tanto suor por detrás desta ambição que só quem está na mesma situação consegue compreender.
Hoje estive na casa de uma amiga que está no 2º ano do meu curso e estava a rogar pragas ao trabalho que estava a fazer e a contar os segundos para entrar de férias, e eu a invejá-la tanto, a querer tanto estar na posição dela... A vida é assim e foi isso que eu aprendi.
Um dia, se entrar, vou ter a certeza que tudo o que fiz valeu a pena. Tudo o que fiz foi por mérito próprio.
Por isso é que polémicas como as do Miguel Relvas me revoltam tanto. Uns com tantas dificuldades e outros com tantas facilidades, não se compreende o funcionamento deste país.

Por isso, companheiros de viagem, caso estejam no 10º ano, toca a começar já a trabalhar para as médias, caso estejam no 12º, informem-se muuuuiiiito bem junto de quem percebe realmente do assunto e quem está no meu caso, à espera de notas para decidir o futuro, calma, muuuuiiita calma!

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