Esta conversa é praticamente inevitável em qualquer grupo. Tenho quase a certeza que já falaram sobre o assunto Cristina Ferreira pelo menos uma vez com alguém. E só por isso, já há aqui um fatorzinho a ter em consideração.
Não sou fã da Cristina. Nunca fui e cheira-me que nunca vou ser.
Mas sou muito fã do conceito Cristina Ferreira.
Sabem? O conceito de trabalho, de dedicação, de perseverança, de força e resistência, de compromisso e foco. A Cristina é um caso de estudo e um sucesso de audiências. Tudo o que toca vira ouro. E isso, quer queiramos quer não, é inegável.
Comparo muitas vezes a Cristina ao Cristiano - que coincidência de nomes - porque lhes admiro o trabalho e o espírito que fazem deles os melhores da área. Mas que também se tornaram pessoas muito viradas para o próprio umbigo.
Acredito que viver num mundo onde nos dizem constantemente que somos os maiores, os melhores, os mais ricos, os mais bem sucedidos, nos torne pessoas ligeiramente mais confiançudas e orgulhosas. Mas de vez em quando é preciso parar e pensar que isso não é tudo na vida, que isso não define a pessoa num todo e que todos nós, mais cedo ou mais tarde, precisaremos dos outros.
Confesso que me enervou toda a polémica sobre a transferência da Cristina para a SIC.
Enervou-me porque via comentários aberrantes sobre isso. Chamaram-lhe de traidora, de cuspir no prato que lhe deu de comer, de ir atrás do dinheiro, de tudo e mais um par de botas. Coisa que nunca ouvi ninguém a dizer ao Ronaldo sempre que ele saia dos clubes em que jogava.
Depois falaram do salário. Que era exorbitante, que havia pessoas no desemprego e a passar fome, que os professores e médicos vivem em condições miseráveis e ela ali a ganhar milhões... Quantas vezes é que ouviram alguém dizer isso sobre o Cristiano, com tanta veemência e com tanta expressão nas notícias diárias ao longo de semanas? E mais, se a Cristina não fosse transferida, os professores e os médicos estariam a ganhar melhor a esta hora? Pois.
Eu não estou a defender, mas acho que devemos ser coerentes. Se ninguém se revolta com um salário de um jogador de futebol, também não se pode revoltar pelo salário, bem mais baixo, de uma apresentadora (ou de uma atriz, cantora, bailarina, realizadora, atleta...). Não podem porque se uma está a "roubar" dinheiro aos médicos e professores deste país, os outros também o estão!
Onde está a diferença? Eu aqui vejo profissionais que são extremamente bons naquilo que fazem, que negociaram contratos de trabalho e que recebem o acordado por ambas as partes. Só.
Onde está a diferença?
Podem dizer-me que o problema está em todos esses receberem muito. Talvez. Ou talvez o problema é todos os restantes - profissões anónimas - receberem muito pouco. Não sei e também não me sinto capaz de discutir economia ou política aqui.
Acho que fomos todos muito mauzinhos com a Cristina. E eu não queria puxar desta carta, mas quanto mais vejo esta novela a decorrer, mais certeza tenho de que
se estivéssemos a falar de um homem, não havia metade do barulho.
Mas agora vamos à entrevista que ela deu no Jornal da Noite.
Que horror.
Ali só vi uma pessoa cheia de si e, sinceramente, com muito pouco conteúdo. Ela disse todos os soundbites que lhe mandaram dizer. Começou por desmontar o jornalista ao convidá-lo para o programa dela, falou das origens muito humildes e pobres, falou dos 500€ que recebia no início da profissão - para que todos louvássemos a corajosa Cristina que sobreviveu a tudo isto -, falou do filho e das namoradas que só a querem conhecer, falou do Goucha e da TVI e de como lhes é grata para sempre, falou da morte de um bebé que a adorava mesmo sem a conhecer, claro que puxou do feminismo e ainda jurou a pés juntos que não está ali por dinheiro.
De tudo isto, eu concordo com uma coisa: quando já se ganhou tudo, a vida deixa de ser desafiante e, por isso, decidiu arriscar na SIC, para comprovar que consegue fazer igual ou melhor. Eu compreendo-a. Juro que sim. Acho que nesse aspeto somos parecidas. Quando algo deixa de me entusiasmar eu procuro a mudança. Foi o que a Cristina fez e fez muito bem.
Uma vida acomodada é mais segura, mas é muito mais chata...
O que eu não gostei em todo este evento mediático - que o foi! - foi um sem fim de coisas que passo a descrever:
- A pompa e circunstância com que foi recebida em horário nobre, no Jornal da Noite, um momento informativo, jornalístico, objetivo. Deixou de o ser no momento em que anunciaram a Cristina e mostraram o seu percurso até à mesa da entrevista (a sério!?).
- Não sei se viram os diretos que a Cristina fez no Instagram, mas eu estava atenta. Ela disse que qualquer pessoa que vai ao Jornal da Noite leva uma camisinha branca, discreta, sóbria. Mas ela não. Ela é A Cristina e por isso vai em bom! E foi, de facto. Mais parecia que ia para uma gala. Aquele era o momento dela e fez questão de marcar bem essa posição.
- Aproveitou a "entrevista" - em que o entrevistador era dispensável - para realças as suas vitórias, a sua posição, as suas metas, as suas capacidades,... Para demonstrar, no fundo, uma grande falta de humildade que ela não se cansa de dizer que tem que lhe chegue e que lhe sobre... só porque ainda vai dormir à Malveira.
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Vamos fazer aqui uma pausa
Eu não estou a dizer que ela não é tudo isso. É. Ela subiu a pulso, tomou as decisões certas. Trabalhou no duro e sabe realmente dar valor às conquistas porque começou sem nada. Está tudo certíssimo. O que eu não gosto é de ouvir a própria pessoa a exaltar essas histórias. É feio, é arrogante, é até um bocado triste. E não me digam que isso é confiança. Confiança é outra coisa. Confiança é precisamente NÃO PRECISAR de realçar tudo isso em público. A Cristina já provou o que tinha para provar. É pioneira em tudo, é um sucesso de vendas e de audiências. Não precisa de justificar, que foi o que ela fez ontem no Jornal da Noite, sem que lhe perguntassem.
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- O tempo de antena que deu ao filho também foi muito, muito bem pensado. As pessoas gostam de saber pormenores pessoais das figuras públicas e a Cristina sabe muito bem dar corda, mas só até àquele ponto. E nessas tiradas ela conseguiu duas coisas: satisfazer a curiosidade das pessoas sobre o filho (tema que todos adoram!) e continuar a falar dela e de quão influenciadora, relevante e importante ela é (o filho é que a alerta para as pessoas que querem tirar fotos com ela, o filho sabe que as namoradas só querem é conhecer a mãe e o filho já não estranha quando as professoras chamam a mãe pelo nome, o que não acontece com as restantes). No fundo, de tudo o que ela disse, o menos relevante foi o Tiago. De génio!
- O momento em que ela fala da morte da criança foi mais do que programado - especialmente as lágrimas nos olhos e as pausas. A sério, foi tudo treinado, não se iludam. E provavelmente isso até é mentira, mas vende tão bem... Digam lá se não ficaram com um nozinho na garganta, hum?
- A tacada da Princesa Diana foi o remate final. Igualmente pensado, planeado. Foi a frase feita para encher as capas das revistas. Aprendam que é assim que se faz!
- Depois a questão das mulheres no estúdio, do feminismo e nas comparações relativas ao salário... A Cristina ia com a lição estudada e sabia bem o que tinha que dizer.
Fiquei deliciada a ver a entrevista porque isto é um caso de estudo para pessoas da minha área. Esteve tudo bem feito. Tudo. Desde as redes sociais ao suspense, a roupa, os sapatos, mas especialmente o momento que ela teve para debitar tudo aquilo que tinha que dizer para vender mais, mais e mais... E em horário nobre!
A Cristina é uma máquina de fazer dinheiro e é uma ótima profissional. Desejo mesmo que tenha o maior sucesso na SIC ou onde quer que seja, porque eu gosto de ver pessoas trabalhadoras a ter sucesso. Servem-me de inspiração para fazer melhor.
Mas também desejo que a Cristina acalme os cavalos com tanto egocentrismo. Está a acontecer-lhe o que aconteceu ao Goucha há alguns anos atrás, mas numa escala muito maior. E depois?
Será que se as coisas começarem a correr mal, como correram ao Goucha, a Cristina Ferreira vai ter uma Cristina Ferreira para a levantar?
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