terça-feira, 24 de março de 2020

Elementar



Anda uma pessoa aqui sempre presente há anos a sugerir-vos o melhor que há para ver, ler, ir e vestir e vocês são incapazes de retribuir... Acho uma desfeita tremenda. A semana passada fiquei em choque: como é que foi possível ao longo de tanto ano decorrido não haver uma única alma que se levantou, que se tivesse chegado à frente e me tivesse avisado. Ninguém. E isso dói, sabem? Ao longo de todos estes anos, que eu sempre achei que existia aqui uma relação de carinho e amizade, não houve uma pessoa que me oferecesse duas chapadonas bem dadas nas fuças por ainda não ter visto Sherlock. I mean, quem precisa de inimigos, né?


Como assim eu só vi Sherlock a semana passada, hum? 


Como? Tanta série e filme manhoso que já vi sem necessidade e Sherlock nunca me chamou a atenção. Como? E agora que acabou, que faço eu à minha vida? Quem é que poderá substituí-lo? Ajudem-me porque eu não estou a saber lidar.


Eu tenho um problema - talvez #Freudexplica, não sei - que quando gosto mesmo muito de alguma coisa, seja o que for, eu não consigo parar de gostar. E gosto muito intensamente. A minha sorte é que não gosto assim de tanta coisa desta forma, tá? Tenham calma. Com as séries e com os livros acontece-me algumas vezes. Quando gosto mesmo muito, não consigo parar de ver e ler e fico muito apegada às personagens e às histórias. O problema é que quando acaba - e acaba muito rapidamente porque eu não consigo parar - parece que é um amigo que vai para longe e com quem muito provavelmente vou deixar de ter contacto. Aconteceu-me isto recentemente com Peaky Blinders e agora, numa escala mais pequena, com Sherlock.




Não é especialmente o meu tipo de série, mas tenho que dar a mão à palmatória: que série do caraças! Entretem, faz-nos rir, põe-nos a pensar e a tentar descobrir pistas, ensina-nos algumas coisas, faz-nos desejar sermos mais inteligentes e, claro, faz-nos também apaixonar pelo autista/sociopata Sherlock Holmes - ou sou só eu?! De verdade que fiquei completamente fixada na personagem principal por toda a sua complexidade e por não ser propriamente boa pessoa. Eu sou sempre mais apologista dos vilões ou dos anti-heróis do que dos bonzinhos. São sempre tão mais interessantes... E interessante podia ser o nome do meio de Sherlock. E isto é mesmo curioso, termos uma ligação assim com uma personagem, mas não propriamente com o ator. Por exemplo, acho que o Sherlock é um gatsooo, mas o ator não - god no!!! Na mesma medida que casava fácil com o Tommy Shelby e não queria nada com o Cillian Murphy. Isto acontece só comigo? Não sei, mais uma vez, talvez #Freudexplica. Ou talvez isto se explique por eu estar sempre mais interessada no intelecto e na personalidade do que propriamente na parte física (que em ambas as personagens, à exceção do penteado, é exatamente igual entre o ator e a personagem que interpreta).


Para além de Sherlock Holmes, fiquei muito apaixonada pela série por se passar em... LONDRES! 


E adivinhem quem ficou com umas saudades terríveis daquela cidade fantástica? Eu. E não adianta dizerem "Ah mas ainda em fevereiro estiveste lá, é impossível teres saudades!". Chiu, eu é que sei e digo-vos que tenho saudades de Londres todos os dias. E agora tenho mais 2 spots para visitar na minha próxima estadia - que eu queria que fosse em maio, mas não me parece porque #coronavirus, né? Mas a sério, vejam Londres através da série e não se vão desiludir.


Mas vamos ser profissionais e siga fazer uma crítica construtiva à série.
Se não quiserem spoilers, fiquem por aqui. Mas duvido que queiram ficar ;)


Sherlock


A série decorreu entre 2010 e 2017. É ligeiramente diferente das outras séries porque cada episódio tem 1h30 de duração - que eu papei a uma velocidade pouco recomendável, até porque quando dei por mim e já não havia mais Sherlock para ninguém *snif* - e todos foram pensados como se fosse um filme. Parece que os episódios quaaaase que não estão interligados, mas no final percebemos que estão e estão muito bem cosidos uns aos outros. Sherlock tem 4 temporadas e 13 episódios (3 temporadas com 3 episódios e 1 temporada com 4).

A história é baseada nos livros de Arthur Conan Doyle mas reinterpretada. As aventuras de Sherlock Holmes e o seu fiel companheiro Dr. John Watson acontecem em Londres dos tempos modernos, mas não se enganem, todos os episódios têm referências à obra original! É quase como uma caçada às pistas escondidas nos cenários e aos detalhes que as personagens vão dizendo. Tecnicamente, tudo está muito bem construído, bem montado e obriga a que o espectador esteja constantemente atento. Isto porque a dinâmica de acontecimentos é muito rápida, porque o Sherlock fala MUITO rápido e porque tudo parecem peças de puzzle que nos vão dando ao longo da narrativa e que, normalmente, se encaixam no final do episódio. Os atores foram escolhidos a dedo para o papel, especialmente os três principais (Benedict, Martin e Mark). I mean, produção e atores britânicos, né? Nunca falham.



Sherlock Holmes (Benedict Cumberbatch - já consigo dizer o nome dele quase sem me enganar!) é um químico/detetive (consultor) mestre na teoria da dedução, o que faz com que apenas com a observação consiga avaliar uma série de aspetos da vida da pessoa - creepy, mas muito interessante. É claramente um sobredotado com zero aptidões sociais - que vão crescendo muuuuito lentamente quando encontra em John o seu primeiro amigo -, mas sem grande cultura geral. E isto é tão incrível: Sherlock descobre todos os mistérios e sabe sempre como se desenvencilhar de todos os problemas e parece sempre a pessoa mais inteligente e superior da sala, mas não sabe quem é Madonna ou Margaret Thatcher e não conhece o Sistema Solar. Segundo ele, não ocupa o seu cérebro com informações insignificantes e que nada contribuem para a sua vida, o que vai de encontro à minha "teoria" de que ser inteligente não é a mesma coisa que ser culto ou interessante. É egoísta, egocêntrico, arrogante, inconveniente e cheio de traumas de infância. Tem qualquer coisa de autista e é absolutamente imprevisível, o que nos garante algumas gargalhadas bem altas, como nesta cena em que se recusa a vestir-se, mesmo estando em Buckingham Palace. É também um viciado em substâncias ilícitas, como seria de esperar. Está sempre bem vestido e quase que conseguimos cheirar o perfume incrível que tem (imagino eu).




John Watson (Martin Freeman) é um soldado e médico que regressa a Londres ferido em combate numa missão no Afeganistão e encontra-se à procura de alojamento. Um amigo informa-o que conhece uma pessoa que procura um companheiro para dividir casa e apresenta-os. É assim que Sherlock e John se conhecem e começam a partilhar o 221B Baker Street, um apartamento simpático  alugado à querida e muito peculiar Mrs. Hudson. John é claramente um homem atormentado pela guerra - o suposto ferimento numa perna que o leva a usar uma muleta é imediatamente identificado por Sherlock como psicossomático. É uma pessoa decente, de grandes valores morais, amigo leal e desenvolve uma amizade com Sherlock da forma como nunca ninguém o conseguiu fazer. É o seu grande companheiro de aventuras que são descritas e publicadas no seu famoso blog. Ao longo do desenvolvimento do rumo da sua vida, Sherlock encontra-se sempre presente, em melhores ou piores fases. John descobre o amor ao lado de Mary, que não é bem o que aparenta ser. Uma curiosidade interessante: os atores eram, efetivamente, um casal na vida real e têm 2 filhos em comum. Divorciaram-se em 2016.




Mycroft Holmes (Mark Gatiss) começa por nos ser apresentado como o arqui-inimigo de Sherlock que tenta corromper John a fornecer-lhe informações sobre o seu recente colega de casa em troca de dinheiro (claro que a proposta foi rapidamente recusada). Mais tarde, John conta a Sherlock o encontro que teve com Mycroft este diz-lhe que é a pessoa mais perigosa e poderosa de Inglaterra. Mycroft é, afinal, o irmão mais velho de Sherlock, com quem não tem uma relação fácil. Mas não se enganem... É mesmo a pessoa mais perigosa e poderosa de Inglaterra e apesar de raramente o admitir, tem um sentimento de proteção enorme para com o irmão. É igualmente brilhante - há várias referências que indicam que é "o irmão inteligente" - e trabalha para o Governo britânico, o que se torna muito útil quando tem que safar o irmão de situações, digamos, complexas. É anti-social, muito solitário e vê no irmão o seu único "amigo" ou a única pessoa que o compreende, mesmo sem nunca o admitir.




Há outras personagens muito interessantes na série, como a Mrs. Hudson - que merecia uma série só dela -, a Mary Watson ou a Molly Hooper - que não aparece na história original e estava previsto que só entrasse numa cena, mas a atriz fez um trabalho tão notável que ficou até ao fim da série. Quanto aos vilões, claro que Jim Moriarty é o mais temível por ser tão brilhante como Sherlock, mas com a psicopatia elevada ao cubo.




Depois há aquela história toda Sherlock-Irene Adler que é maravilhosa. Ela, uma mulher lindíssima e inteligente na mesma proporção, que ganha a vida a ser dominatrix de gente importante, acaba por se interessar por Sherlock, mesmo numa situação pouco propícia a isso. Por sua vez, Sherlock tem zero jeito para relações sociais, muito menos amorosas - como comprova a personagem de Molly, a eterna apaixonada - e depara-se com sentimentos e emoções que nunca tinha experienciado  A cena em que ele decifra o código do cofre e ainda o código para ter acesso ao seu telemóvel é só incrível e que eu só entendi mais à frente - que é como quem diz, quando fui ler sobre a série, claro. O código de 4 números é 7437, que nos teclados dos telemóveis antigos formam a palavra SHER (de SHERlock), mas o segundo sentido é sherLOCK. Lock de fechado/selado, entendem? Não é brilhante? E todo o "romance" à volta destes dois é tão out do que estamos habituados a ver por aí que acaba por ser entusiasmante - e por nunca existir um desfecho concreto, claro.




Um fun fact da série, para além de John e Mary serem mesmo um casal, é que os atores que fazem de pais de Sherlock e Mycroft (na imagem em cima) são os pais na vida real de Benedict Cumberbatch. Outro aspeto interessante (para mim) é que entre 2012 e 2014, os dois atores principais da série estiveram a gravar a trilogia Hobbit. Martin Freeman era Bilbo, o hobbit, a personagem principal, e Benedict deu voz e corpo a Smaug (o dragão) e ao Necromancer.

Acreditam agora quando eu digo que investigo tudo ao pormenor? E sabem o que faço quando acabo de ver uma série que adoro por amor? Volto a ver o primeiro episódio para me recordar como tudo começou e os detalhes que fui perdendo. O primeiro episódio foi revisto. Um dia revejo o resto.




Agora preciso de outra série verdadeiramente viciante. Any ideias? Não vale coisas do sobrenatural ou viagens no tempo tipo Dark e Stranger Things. Já tentei e não-obrigada. Comecei a ver Sons of Anarchy, mas parece-me um investimento demasiado longo e não me cativou, nem ao quarto episódio, logo, vou abandonar. Gosto de vários estilos, desde que tenha uma boa história, uma boa produção e boas personagens. Difícil? É o mínimo que podem fazer por mim, já que andam há 10 anos a esconder-me esta série.

Help!





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