segunda-feira, 28 de setembro de 2020

A notável Ruth Bader Ginsburg



Gostava de ter publicado este texto mais cedo, mas não consegui. A morte da juíza Ruth Bader Ginsburg deixou uma marca enorme em todas as pessoas que, de alguma forma, conheciam o seu trabalho e a importância que teve para os direitos humanos, especialmente, os direitos das mulheres. Apesar de aparentemente ter pedido, como último desejo, que não se nomeasse uma substituta para o seu lugar antes das eleições, Donald Trump não deixou escapar a oportunidade de colocar mais uma conservadora no Supremo Tribunal. Amy Coney Barrett vai ocupar o lugar de uma personalidade notável e, assim, votar para o lado conservador em temas fraturantes para a sociedade. Ficamos todos a perder em todos os níveis.


Mas vamos focar-nos na vida desta maravilhosa mulher que, de uma forma discreta e profissional, mudou a mentalidade e a legislação de uma das maiores potências mundiais.


“Eu sabia que estava a falar para homens que achavam que não existia discriminação sexual e o meu trabalho foi mostrar-lhes que existe mesmo.”


Ruth perseguiu o sonho de iniciar a carreira de advocacia, mesmo quando as mulheres ainda não tinham espaço sequer para sonhar algo semelhante. Em 1956 ingressou no curso de Direito da Universidade de Harvard. Era 1 das 9 mulheres do curso, entre uma turma de 500 e onde um professor lhes perguntou “Como justificam terem tirado o lugar de homens qualificados?”. Em 1959, depois de concluir os estudos, nenhuma firma de advogados lhe ofereceu trabalho, justificando que “não contratam mulheres”. Sofrendo na pele a discriminação de género, fez desta luta o seu caminho e a sua missão, parando apenas a 18 de setembro de 2020, triste dia da sua morte, aos 87 anos.


A juíza teve uma carreira notável, repleta de sucessos e de desbravamento de caminho, rumo a uma Lei mais justa e equalitária para todas as pessoas. Apesar de tímida, discreta e introvertida, nunca lhe faltou força e voz para defender homens e mulheres, sendo ela própria o exemplo de que é possível contornar o sistema e ensinar-lhe uma lição. 




Iniciou a carreira de ensino em 1963, tornando-se uma das menos de 20 mulheres a lecionar Direito nos EUA. Recebia menos do que os seus colegas homens porque “o seu marido já era bem remunerado”. Em 1970 co-fundou o primeiro jornal de direito dos EUA a focar-se nos direitos das mulheres, o “Women’s Rights Law Reporter”. 2 anos depois, co-fundou o projeto dos Direitos das Mulheres, na União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU) que defendeu mais de 300 casos de discriminação em 1974, sendo que Ruth participou e venceu vários.


Em 1993 foi nomeada pelo Senado para a Suprema Corte, a maior conquista da sua carreira, onde permaneceu até à sua morte. Foi a segunda mulher na História a conseguir este feito.



Mantinha uma relação muito próxima com o conservador Antonia Scalia, Juiz da Suprema Corte, mostrando-nos que mesmo não concordando com os ideais do outro (Ruth era liberal, caso ainda não se tenham apercebido), é possível sermos respeitosos e convivermos harmoniosamente. Apesar de discordarem em questões políticas, partilhavam vários interesses e hobbies, o que os aproximou e tornou as negociações, consequentemente, mais fáceis. Mais uma lição de diplomacia e de cidadania.


“Homens e mulheres são pessoas com a mesma dignidade e devem contar com equidade perante a Lei.”


Em 1999 foi diagnosticada com cancro do cólon e em 2009 com cancro do pâncreas. Em todos estes momentos, manteve-se ativa, mesmo durante os tratamentos, e nunca deixou de trabalhar, inclusive, contratou um personal trainer para se obrigar a manter ativa. Em 2018, depois de uma queda onde fraturou 3 costelas, encontraram nódulos malignos nos pulmões.  Ainda no hospital, votou contra as restrições a pedidos de asilo a imigrantes propostas por Trump. Este voto foi decisivo. Em 2019 o cancro do pâncreas regressa e foi o motivo da sua morte a 18 de setembro de 2020, em sua casa. Viveu um casamento feliz, ao lado de um homem que compreendia a sua grandeza e sempre a apoiou, ao longo de 56 anos, até à morte de Martin em 2010. Teve uma filha (Jane) e um filho (James).


Tornou-se um ícone pop e a sua imagem foi espalhada um pouco por todo o mundo, sendo o epicentro da fama, os EUA, onde foi a responsável direta pelo fim da discriminação de género em várias áreas da legislação.




A história desta heroína do século XXI merece ser contada e recontada a todos os que estão cá e todos os outros que hão-de vir e está muito bem retratada na primeira pessoa no inspirador documentário “RBG” (2018), nomeado para a categoria de Melhor Documentário nos Oscars 2019, e que é de visualização obrigatória! Foi também contada no filme “Uma Luta Desigual” (2018), em que Ruth foi interpretada por Felicity Jones.


Para mim será sempre uma das minhas notáveis, como já referi aqui no blog.
Rest in power, Ruth.




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